Deixo aqui um artigo da minha autoria publicado, num dos últimos números do jornal Miradouro. No jornal saiu assinado C.R.(responsabilidade do editor) o que levou muita gente a pensar que quem o escreveu queria manter o anonimato. Como sempre defendi neste fórum que as pessoas não se escondam no anonimato, trancrevo para aqui o artigo.
Que te fizemos Montemuro!!
Montemuro, Montemuro, que te fizemos? Eras a serra mais desconhecida de Portugal, mas eras a serra mais bela e mais tranquila. Quem quisesse gozar de umas horas de calma e sossego, era subir às tuas cumeeiras e deleitar-se com a vista deslumbrante, com a tranquilidade total e sobretudo com o silêncio; ai o silêncio, esse bem cada vez mais raro. Quantas vezes, nas minhas caçadas, subi aos teus cumes e o silêncio era ensurdecedor, quantos sonos dormi em cima de um penedo, com o sol soalheiro a aquecer-me, embalado pelo som da teimosa cotovia, na sua luta contra o vento, e a voz do meu pai que afoutava os cães a ficar cada vez mais longe; que saudades, dos segredos que as tuas penedias e arbustos me contavam, quando o vento passava por eles e lhes trazia notícias de outras serras. E hoje, que te fizeram Montemuro? Esventraram as tuas entranhas, onde só se chegava a pé ou a cavalo, hoje chega-se de Carro, de Jipe e de Mota; essas ruidosas motas, que espantam os teus animais e quebram o teu silêncio. Mas as motas, essa moda que todos querem seguir, só te perturbam de vez em quando, pior que as motos, muito pior, são esses monstros de aço que colocaram nos teus cumes; os teus habitantes, nos quais eu me incluo, a troco de uns míseros euros, que a ninguém faziam falta, permitiram que te invadissem com esses monstros e quebrassem irremediavelmente o teu sossego. Hoje quem passeia ou caça nos teus cumes, não pode mais desfrutar dos teus sons naturais, aqueles monstros com a barulheira que fazem, não permitem que se permaneça muito tempo na serra. Em dias de ventania, parece que a nossa cabeça vai explodir, aquele roncar constante, parecendo um avião a voar a baixa altitude e que passa por cima de nós de cinco em cinco segundos, dá cabo da calma e tranquilidade de qualquer um. Por tudo isto Montemuro, desculpa o que te fizemos, e lá dos teus quase mil e quatrocentos metros, aproveita um dia de calmaria, e pede a Deus que nos perdoe; talvez que num desses dias ele te consiga ouvir, porque num dia normal terá um pouco de dificuldade em te escutar. E daqui a vinte e tal anos, quando a torres deixarem de ser lucrativas, que mais te irão fazer? Não sei, mas como diz o povo, quem muito mal está, pior não pode ficar.
Gralheira, 17 de Outubro de 2009
José Carlos de Jesus Rodrigues
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